Nos primórdios do cinema, não havia ainda salas exclusivas de exibição de filmes. Durante muito tempo, os filmes foram exibidos como curiosidades ou peças de entreato nos intervalos de apresentações ao vivo em circos, feiras ou carroças de mambembes. Os domadores de feras, os homens-tronco, os praticantes de luta-livre, os proprietários de museus de cera ou de palácios da eletricidade serviam-se dos filmes como atrações às portas das barracas. Nos grandes centros urbanos dos países industrializados, porém, a exibição de filmes muito cedo se concentrou em casas de espetáculos de variedades, onde se podia também comer, beber e dançar, conhecidas como music-halls (na Inglaterra), café-concerts (na França) e vaudevilles (nos Estados Unidos). Neste último país, particularmente, floresceu um tipo de estabelecimento conhecido como penny arcade (assim chamado porque nele se pagava uma moeda de um pêni, ou um centavo de dólar), onde se colocava à disposição do público uma grande variedades de máquinas de jogar e inclusive o quinetoscópio de Edison (aparelho de projeção cinematográfica com visor individual). Mas foram nas casas de variedades (que, para efeito de simplificação, vamos chamar genericamente de vaudevilles), em pleno apogeu na virada do século, que o cinema floresceu com maior vigor. Eram locais bastante populares e também um tanto mal afamados por causa da atmosfera plebéia e do “baixo nível” dos espetáculos burlescos ali encenados. Na verdade, os vaudevilles eram abominados pelas platéias sofisticadas e pelas pessoas de “boa família”. Quando, num primeiro momento, a venda de álcool era ainda tolerada nesses locais e a prostituição florescia ao seu redor, não era difícil que uma visita a uma dessas casas se transformasse em bebedeira, quebra-quebra ou aventura sexual.
O cinema era então uma das atrações entre as outras tantas oferecidas pelos vaudevilles, mas nunca uma atração exclusiva, nem mesmo a principal. A própria duração dos filmes (de alguns segundos a não mais que cinco minutos) impedia que se pensasse em sessões exclusivas de cinema nos primeiros anos do cinematógrafo. Seria preciso esperar pelo florescimento e hegemonia comercial dos nickelodeons (novamente aqui o nome é derivado do fato de se pagar uma moeda de um níquel, ou cinco centavos de dólar, para entrar) para que essa situação se invertesse. Os nickelodeons eram salas cativas de cinema que surgiram muito cedo, mas cujo papel econômico no mercado de filmes era então irrisório, comparativamente àquele dos vaudevilles. Nos seus primeiros anos, os nickelodeons não passavam de armazéns adaptados, sujos, pouco confortáveis e sem condições de segurança. O preço cobrado pelo ingresso era ainda muito baixo para que pudesse funcionar como mecanismo de seleção, de modo que o público dessas salas, nos seus primeiros anos, coincidia de ser o mesmo dos vaudevilles. A importância dos nickelodeons só vai começar a aparecer de dez a quinze anos depois da comercialização dos primeiros filmes nos vaudevilles.
O público de todas essas casas era constituído principalmente pelas camadas proletárias dos cinturões industriais. Era uma clientela predominantemente masculina, recrutada nos segmentos mais pobres e mais desclassificados culturalmente da população. Nos Estados Unidos, particularmente, os imigrantes constituíam o público principal das salas de exibição, pois o desconhecimento da língua inglesa interditava o teatro e outras formas de espetáculos baseadas predominantemente na palavra a essas multidões originárias a maior parte delas da Europa Central. Não se pode esquecer de que, no período inicial de formação da indústria cinematográfica, a imigração estava no seu pico máximo, com os estrangeiros afluindo à América do Norte num ritmo superior a um milhão de pessoas por ano. Governo e instituições privadas chegaram mesmo a lançar mão do cinema para dar aos recém-chegados informações sobre a lei e os costumes americanos: as sessões de cinema organizadas por uma certa Kleine Optical Company, por exemplo, eram intercaladas com palestras sobre os problemas do alcoolismo, religião, moral familiar e até instruções para enfrentar os “agitadores” nas fábricas.