Esse pequeno filme de Smith começa a colocar problemas novos para o cinema, problemas que certamente não podiam ser cogitados nos limites da cena teatral. De fato, tanto a saída de campo dos dois antagonistas (saída irreversível, sem volta e sem continuação), quanto a entrada em campo de uma pequena multidão “surgida do nada” trazem à baila a existência de um espaço contíguo ao do cubo cênico, espaço este não mostrado mas pressuposto, ao qual se vai dar o nome, muito mais tarde, de espaço off ou “fora do quadro”. Ao mesmo tempo, aquela ação que a câmera mostra toda num único quadro, começa a ser percebida também como um fragmento temporal não concluído, pressupondo portanto um antes (a formação da multidão para ver a briga) e um depois (a perseguição propriamente dita). Em outras palavras, Miller and Sweep é um filme onde já se pode antever uma relação potencial de contiguidade espacial e de continuidade temporal, que o cinema ainda não explora, mas que já se faz sentir como uma possibilidade a ser desenvolvida.
Em 1901, um outro inglês, James Williamson, realiza Stop Thief! (Pega Ladrão!), onde o passo seguinte seria dado. Aqui, um ladrão rouba um pedaço de carne de um açougueiro que levava a mercadoria para a sua loja, dando início a uma típica situação de perseguição. No final, o ladrão esconde-se dentro de um barril, mas é descoberto pelo faro de um cachorro e devidamente castigado em seguida. Pode-se dizer que este filme inicia a grande tradição do filme de perseguição, sobretudo por introduzir um elemento novo, não presente no filme de Smith: a continuação da ação de um quadro a outro. Para representar a ação completa, ou seja, o roubo, a perseguição do ladrão e o castigo final, Williamson percebeu que deveria utilizar três quadros distintos, já que não seria possível concentrar tudo num quadro só (a perseguição exige corrida e quando se corre é inevitável que se saia para fora do quadro). No primeiro quadro, o ladrão foge com o objeto do roubo, perseguido pelo açougueiro e saindo ambos por uma das bordas do quadro. No segundo, vemos uma típica paisagem de subúrbio, com os moradores acorrendo às portas e janelas para ver o que estava acontecendo, enquanto ladrão e perseguidor atravessam a tela correndo, entrando por um lado e saindo pelo outro. No terceiro, vemos o ladrão entrando no barril, sendo descoberto e finalmente castigado.
Segundo o historiador Noel Burch, Williamson coloca em operação nesse filme dois conceitos que serão fundamentais para o processo de linearização narrativa: o de uma sucessão dos eventos no tempo e o de uma contiguidade da ação no espaço. Nos três quadros de Stop Thief!, temos já delineada a estrutura mínima de todo e qualquer filme de perseguição: o primeiro quadro faz a exposição dos motivos, ou seja, mostra a razão da perseguição; o segundo corresponde ao desenvolvimento da ação, ou seja, o curso da perseguição propriamente dita; finalmente, o terceiro quadro dá a resolução da história, em geral com a captura do(s) perseguido(s) pelo(s) perseguidor(es).